domingo, 28 de agosto de 2011

"ABILOLAMENTOS DE UM MUNDO NOVO"

Em algum momento da sua vida você já imaginou a juventude brasileira interativa (e hiperativa) que domina a internet sentada em um círculo e ao centro um pop-star, roqueiro famoso nas últimas três décadas, deitando no divã e disposto a ser paciente (em amplo sentido) desses “neodoutores” da humanidade virtual? Será que você pode imaginar o resultado dessa dissecação psicológica na rede? Eis que já existe uma resposta para essas e outras questões do gênero. Carlos Maltz, o primeiro baterista e fundador da banda Engenheiros do Hawaii, que também é psicólogo e astrólogo, decidiu ficar nu e, confortavelmente, instalar-se sob os auspícios de nicknames analistas.


O resultado dessa jornada extraordinária é o que você irá encontrar em “Abilolado Mundo Novo” (Editora Via Lettera, 240 páginas, 2010), livro de primeira grandeza que Carlos Maltz lançou na primavera do ano passado. Nele, leitores de todas as idades podem acompanhar dos mais complexos e delicados diálogos a bizarrices quase impublicáveis entre o artista e seus seis abilolados, jovens escolhidos e construídos à minucia durante as muitas “trovas” que travaram. O espaço da ação? Mais adequado e moderno impossível: um chat de conversas virtuais que Carlos Maltz mantem em seu site pessoal (www.carlosmaltz.com.br).


O escritor Carlos Maltz foi extremamente feliz ao transcrever nas páginas de sua obra os vertiginosos “grandes temas” da sociedade que ele se propôs a debater (e POPularizar) na “Com-Unidade-1-Manos” com figuras das mais díspares, de diversas faixas etárias e com graus de compreensão totalmente diferentes sobre um mesmo tema. É nesse ambiente fecundo que nascem capítulos como “Fast-Freud: Os do-Mal e os Nor-Mal” e “Os Besta do Após-Calypso” e o narrador no divã virtual vai conduzindo seus “avatares”, lastreados por Jung, Nietzsche, Bauman, Pollock, sem deixar de lado Al Gore, R.E.M e até Zé Ramalho. Abilolamentos de um mundo novo, teclados no mais puro e legítimo “internetês” e que nutrem o cerne de uma obra cuja diversidade cultural raras vezes foi abraçada de forma tão majestosa pela literatura brasileira.


O próprio Carlos Maltz diz em sua canção “Depois de Nós”, pérola do seu projeto “Irmandade Interplanetária”, de 1996, e que ganhou uma versão toda especial no Acústico MTV dos Engenheiros do Hawaii, em 2004: “Hoje o tempo voa nas asas de um avião. Leve, sobrevoa os campos da destruição. É um mensageiro das almas que virão ao mundo depois de nós”. O tempo, de tão assombroso dinamismo, já abandonou as asas do avião e hoje “voa” através de fibras óticas e em ondas invisíveis; os “campos da destruição” agora são imperiosamente virtuais; as “almas” tem nicknames, avatares e são multicoloridas, geralmente medidas em pixels; e “aqueles que virão ao mundo depois de nós”, já chegaram. Arrombaram a porta idílica antes guardada por heróis e invadiram, em completo domínio de seus (e dos nossos) meios, o que nos era suprassensorial e intangível.


Sorte nossa que Maltz é um profundo conhecedor do tempo e dos astros e de todas as flutuações que os permeiam em dinamismo e estagnação. Sorte nossa que ele transcendeu o pop-star e agora lança-se em voo pela filosofia-pop. E em se tratando de Carlos Maltz e sua obra genial, talvez voar não seja o verbo adequado e o seja até mesmo anacrônico. Aquele “Admirável Mundo Novo” do escritor inglês Aldous Huxley voava na imaginação de “pré-condicionamentos” biológicos e psicológicos em busca de uma harmonia. O “Abilolado Mundo Novo” de Carlos Maltz navega. E o faz pelos desconhecidos e tormentosos mares virtuais. “E vc, ñ vai tc nessa nau?”

Helder Caldeira

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